A Polícia Civil confirmou, durante coletiva na tarde desta sexta-feira (18), que as armas utilizadas no assassinato de Mãe Bernadete, na noite de quinta-feira (17), em Simões Filho, são de uso restrito. Investigações preliminares indicam que a yalorixá e líder do Quilombo Pitanga dos Palmares foi morta com tiros de calibre 9mm.
"A perícia localizou vários vestígios de calibre 9mm. Por essa ser uma arma de uso restrito, ela é usada por indivíduo de índole mais violenta, que tem coragem para cometer o crime, o que requer uma atenção maior da investigação", disse a delegada Andréa Ribeiro, diretora do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP).
Leia também:
Ainda de acordo com a policial, não há uma linha de investigação definida. Com isso, não está descartado que o crime tenha correlação com a morte do filho de Mãe Bernadete, em 2017, Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, que era mais conhecido como Binho do Quilombo. O líder quilombola foi atingido por vários disparos de arma de fogo quando estava dentro de um veículo, na manhã do dia 19 de setembro daquele ano.
"O nosso foco agora é trabalhar na elucidação desse crime. Mas é lógico que não podemos descartar uma possível correlação com a morte do filho dela, ocorrida em 2017", afirmou a delegada, que destacou que a polícia também trabalha com outras hipóteses como ameaças e atuação do tráfico de drogas na região.
Uma equipe multidisciplinar da Polícia Civil está trabalhando na investigação do caso. De acordo com a corporação estão envolvidos os departamentos de Polícia Metropolitana (Depom); de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP); Especializado de Investigação e Repressão ao Narcotráfico (Denarc); de Inteligência Policial (DIP) e Coordenação de Conflitos Fundiários (CCF).
A polícia destacou ainda que as investigações, já reforçadas, utilizarão toda tecnologia disponível, junto com as perícias realizadas pelo Departamento de Polícia Técnica (DPT). No momento em que foi assassinada, Mãe Bernadete estava com três netos.
Crime
A yalorixá e líder do Quilombo Pitanga dos Palmares, Maria Bernadete Pacífico, que é mais conhecida como Mãe Bernadete, foi assassinada na noite desta quinta-feira (17), em Simões Filho, cidade da Região Metropolitana de Salvador. O crime aconteceu dentro de um imóvel que pertence a Base Comunitária, onde habita a família da religiosa. A suspeita inicial é de que o caso esteja ligado a tentativas de invasão e ocupação de terras na região.
Segundo informações da Secretaria da Segurança Pública da Bahia, dois homens, ainda não identificados e usando capacetes, entraram no imóvel por volta das 20h, fizeram familiares da vítima reféns e fugiram levando celulares.
O filho da idosa de 72 anos pediu justiça durante uma entrevista à TV Bahia. Wellington dos Santos também relembrou o assassinato do irmão Flávio Gabriel Pacífico, conhecido como Binho do Quilombo, em 2017. Ele ainda afirmou que a mãe estava com três netos no momento em que foi morta e que ela foi atingida por tiros no rosto .
"Minha família está sendo perseguida. Em 2017, meu irmão foi assassinado da mesma forma e ontem minha mãe foi executada enquanto estava com seus três netos. Queria saber o que a gente fez para esse povo. Não sabia que fazer o bem contraria tanto as elites", disse o filho da líder assassinada.
Wellington ainda afirmou acreditar em uma relação entre as mortes da mãe e do irmão. "Um crime liga ao outro. Eu confio na justiça de Deus e dos homens. Desse jeito, eles querem dizimar minha família", disse.
"Agora só tem eu, então eu sou o próximo, mas eu não tenho medo não, eu só nasci uma vez e morrerei apenas uma vez e morrerei lutando", completou.
Quem era Mãe Bernadete Pacífico
Liderança quilombola, ex-secretária de Políticas de Promoção da Igualdade Racial na cidade de Simões Filho e yalorixá. Esses eram alguns dos títulos de importância de Maria Bernadete Pacífico, de 72 anos.
Líder do Quilombo Pitanga dos Palmares, local que abriga 289 famílias em 854,2 hectares, Bernadete lutava pelo processo de titulação do quilombo, que em 2017 foi reconhecido pelo Relatório Técnico de Identificação e Delimitação – RTID do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), e certificada pela Fundação Palmares.
O Quilombo gerido por Mãe Bernadete, era um dos quilombos oficialmente registrados no último Censo Quilombola do Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE).
Autoridades lamentaram a morte da yalorixá
Autoridades, políticos, lideranças e entidades negras lamentaram o crime através das redes sociais e por meio de posicionamentos oficiais. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva se pronunciou e mostrou preocupação com o caso. Ele pediu uma "investigação rigorosa".
Em nota divulgada na noite de quinta (17), a Conaq exige que o Estado tome medidas imediatas para a proteção das lideranças do Quilombo de Pitanga de Palmares. "A família Conaq sente profundamente a perda de uma mulher tão sábia e de uma verdadeira liderança. Sua partida prematura é uma perda irreparável não apenas para a comunidade quilombola, mas para todo o movimento de defesa dos direitos humanos", diz o posicionamento.
O assassinato da religiosa será apurado pela Polícia Civil. Em posicionamento publicado no Twitter, o governador Jerônimo Rodrigues disse estar indignado com o crime e detalhou que, assim que tomou conhecimento do caso, determinou a mobilização da corporação e da Polícia Militar para o local, e pediu firmeza nas investigações.
Uma comitiva liderada pelos ministérios da Igualdade Racial, Justiça e Direitos Humanos será enviada na sexta-feira (18) para a comunidade, conforme anunciado pelas pastas nas redes sociais. O grupo deve fazer reuniões presenciais com órgãos baianos e prestar atendimentos às vitimas e familiares, para que seja garantida proteção e defesa do território. O Ministério da Igualdade Racial também irá convocar reunião extraordinária do grupo de trabalho de enfrentamento ao racismo religioso.
O Quilombo
A comunidade é formada por mais de 280 famílias e tem 854,2 hectares, reconhecidos em 2017 pelo Relatório Técnico de Identificação e Delimitação – RTID do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O quilombo já foi certificado pela Fundação Palmares, mas o processo de titulação ainda não foi concluído.
O levantamento da Rede de Observatórios de Segurança, que foi divulgado em junho deste ano, já apontava a Bahia como o segundo estado do Brasil com mais ocorrências de violência contra povos e comunidades tradicionais. Atrás apenas do Pará, o estado registrou 428 vítimas de violência no intervalo de 2017 a 2022.
Redação iBahia
Redação iBahia
Participe do canal
no Whatsapp e receba notícias em primeira mão!