A Universidade Federal do Rio de Janeiro anunciou que vai colocar lonas no Museu Histórico Nacional, na Quinta da Boa Vista, para proteger da chuva parte do acervo que possa ter sobrevivido ao fogo e esteja sob escombros. A proteção ainda não foi necessária neste sábado. A previsão para este domingo é de tempo instável.
Segundo a UFRJ, a Reitoria deve contratar em breve uma empresa para instalar um telhado, com previsão de área de 5 mil metros quadrados. Em conjunto com o Iphan e a Unesco, a universidade elaborou um termo de referência com as exigências técnicas do projeto, e empresas já mostraram interesse. A obra será custeada com uma verba anunciada pelo Ministério da Educação (MEC) de R$ 10 milhões.
Do lado de fora do museu, também há mudanças em curso. Quase duas semanas após o incêndio que devastou a maior parte dele, ainda é possível sentir o cheiro de queimado na proximidade da antiga residência da família real. A calma do parque, no entanto, era interrompida nesta manhã pelo barulho de britadeiras, que furavam o asfalto para permitir a instalação de estacas de madeira. A estrutura vai servir de suporte à continuação de uma cerca metálica que começou a ser instalada há poucos dias.
O ministério também já prometeu outros R$ 5 milhões para uma etapa posterior, a serem investidos na reconstrução do palácio. Já a reconstituição do acervo segue por outros caminhos, com uma comissão internacional formada por profissionais do museu e integrantes indicados pelo governo federal, que devem fazer o diálogo com países e instituições internacionais dispostas a contribuir. Apesar de vários acenos positivos, até o momento, nenhuma proposta foi formalizada.
A PESQUISA CONTINUA
Se, para quem passa em frente aos escombros, o cenário desolador pode dar a impressão de que o fogo paralisou as atividades de quem trabalhava no museu, a mestranda em Paleontologia Beatriz Hörmanseder é testemunha dos esforços para manter a pesquisa em andamento, apesar das dificuldades. Depois de dois anos preparando um fóssil para ser descrito em sua dissertação, a bióloga já conta com a possibilidade de mudar o objeto de estudo. Em vez de escrever sobre um antepassado de nossos jacarés — um "anão" com menos de um metro de comprimento escavado em Araripe, no Ceará —, ela pode acabar se debruçando sobre um fóssil muito maior, descoberto fora do Brasil e pertencente a uma era geológica mais recente. A pesquisa continua graças a uma parceria com o Museu de Ciências da Terra, vinculado ao CPRM.
— Pode ser que o meu projeto mude da água para o vinho, mas o importante é continuar estudando — diz ela, conformada com a “mudança de casa”. — Estamos todos muito unidos aqui, compartilhando as salas de trabalho, e motivados em manter a pesquisa funcionando.
Neste sábado, a estudante de pós-graduação participava do III Colóquio de Zoologia Cultural, evento que acabou tendo a programação alterada para abrigar uma fala de alunos do museu. Uma das líderes da homenagem, Beatriz tem agora uma preocupação muito concreta: com a proximidade do período de seleção para os cursos de pós-graduação, ela teme que possíveis candidatos deixem de se inscrever por acharem que a instituição parou.
— Tivemos aula na mesma semana do incêndio, mesmo com o luto pelo que aconteceu. Sempre tem o que fazer. Os objetos podem ter sido destruídos, mas os prazos de pesquisa continuam, e a gente trabalha com o que tem — diz.
O técnico em geofísica Joelson Moreira, que aproveita o espaço da Quinta da Boa Vista desde a infância, torce para que algo bom surja da tragédia. A sua parte, ele já começou a fazer: vem fotografando o museu desde o incêndio para capturar o processo de reconstrução, e pretende doar o material, junto com os direitos autorais, à instituição:
— Desde 2015, que teve um verão muito quente, a gente já tinha medo de algo assim acontecer. O abandono era visível, embora a gente saiba que a culpa não era dos funcionários. Quem sabe assim, as pessoas passem a valorizar mais, e a frequentar mais os museus? — idealiza.
A valorização também é palavra de ordem na boca dos ambulantes Geraldo e Jurema Marinho, que, há 15 anos, vendem salgados em frente ao antigo palácio. Eles contam que muitas vezes tinham que explicar a frequentadores o que era o belo edifício com mais de 200 anos de idade.
— Quando as crianças ficavam sabendo que lá dentro tinha múmias e dinossauros, começavam a espernear para entrar e conhecer. Mas vi muitos pais dizendo que não iriam, porque museu é lugar de velharia — conta Geraldo, que tem a fala complementada pela mulher.
— Em dia de jogo, as pessoas jogam garrafas, e até pedras na estátua de Dom Pedro II. Nunca vi tanta gente aqui como logo depois do incêndio. Sou de um tempo em que passeio de escola pública era excursão a museu: a gente que teve essa oportunidade aprendeu a apreciar o que tinha — diz Jurema.
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Redação iBahia
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