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Artistas baianos falam de encontros culturais com encenador Zé Celso

Morte do artista, de 86 anos, foi confirmada no dia 6 de julho

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Arlon Souza

08/07/2023 às 11:32 • Atualizada em 08/07/2023 às 12:03 - há XX semanas
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					Artistas baianos falam de encontros culturais com encenador Zé Celso
Zé Celso Martinez Corrêa. Foto: Divulgação

Zé, Zé Celso, José Celso Martinez Corrêa (1937-2023). Transgressor, anárquico, polêmico, subversivo... Adjetivos são inúmeros, mas nenhum capaz de decifrar ou definir a sua personalidade inquieta, irreverente e provocadora. Revolucionário, no campo teatral, é considerado um dos emblemas do movimento tropicalista, com a primeira montagem da peça “O Rei da Vela”, de Oswald de Andrade, em 1967.

Desde o início da carreira, foi notado e reconhecido com o atual Prêmio APCA; além de diversos outros, como o Shell e o Moliére. Mas foi na ousadia e na vanguarda de suas criações que ele mais se projetou para o Brasil e o mundo, causando espanto até em países de vanguardismo na arte contemporânea, como a Alemanha. Um fabricador de delírios. Um tropicalista antropofágico. “Uma voz plural, de denúncia, de contestação, de alerta... Homem de teatro, da imagem, da palavra e do coletivo chamado Oficina”, como lucidamente descreveu seu amigo e parceiro Gilberto Gil.

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Entre as dezenas de espetáculos que dirigiu, adaptou e atuou, peças de sua autoria e de grandes nomes da dramaturgia e da literatura brasileira e mundial, como Máximo Gorki, William Shakespeare, Eurípides, Chico Buarque, Nelson Rodrigues, Oswald de Andrade, Euclides da Cunha, Samuel Beckett, entre diversos outros. Sua história com o teatro começa no final da década de 1950,quando decide deixar o curso de Direito na USP e fundar o Teatro Oficina, juntamente com Amir Haddad e Carlos Queiroz Telles. Daí, o Teatro Oficina e a Companhia de Teatro Oficina Uzyna Uzona constroem um legado de produções magistrais.

Nessa intensa trajetória, a Bahia e os artistas baianos têm uma participação muito especial. Inclusive, como palco e como elenco de vários de seus espetáculos. O ator baiano Othon Bastos atuou em suas montagens. Aqui, na década de 1970, no Teatro Castro Alves, apresentou vários espetáculos: ”O Rei da Vela”, “Os Pequenos Burgueses”, “Galileu, Galilei”... Nessa mesma época, em 1979, Zé Celso e o Teatro Oficina estavam em Salvador para o Congresso de Reconstrução da UNE, quando Ruy César se tornou presidente da entidade. De Mãe Stella, recebeu o título de “Exu senhor das artes cênicas”. Em 2007, trouxe para o Museu do Ritmo, em Salvador, uma réplica das galerias do Teatro Oficina, onde apresentou a sua saga de “Os Sertões”, de Euclides da Cunha, história da qual se declarou fascinado desde criança. A montagem, também teve apresentações no sertão de Canudos. Em 2010, apresentou em Salvador “As Dionisíacas”, onde hoje funciona o PAF 4 e o PAF 5 da UFBA.

Entre essas e uma série de outras memórias, a pergunta: Quantas Bahias cabem no universo, no mundo e no imaginário do agora encantado José Celso Martinez Corrêa, que partiu no dia 06 de julho de 2023 para “a morada do sol”? Veja o que dizem os artistas baianos.

Beto Mettig - ator e jornalista


				
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Beto Mettig em cena do espetáculo Cacilda. Foto: João Maria Silva Júnior

"Como todo mundo, eu ainda estou processando o que significa essa perda, pessoalmente, para o teatro, para o Brasil. Zé é um dos maiores artistas do mundo e conseguiu criar uma linguagem que extrapolou o próprio teatro. Hamlet foi a primeira peça do Oficina que me tirou do eixo, ainda como público. Lembro de ter ficado extasiado com tudo, seduzido pela poética do texto, pelas interpretações, pelo teatro. Mas nunca imaginei que anos mais tarde estaria em cena exatamente ali, com ele e com todo o Tyazo da Uzyna Uzona. Essa é uma experiência que atravessa a gente e transforma a maneira de fazer teatro, de pensar a própria vida. Parece um pouco abstrato falar assim, mas a verdade é que o mundo se encontra nas peças do Oficina. A dramaturgia de Zé Celso trás política, libido, referências pop, fatos cotidianos, poesia e público para contracenarem juntos. Em nenhum outro lugar isso acontece desse jeito e quem já se permitiu viver essa experiência, quem já sentiu o frio na barriga de estar ali, naquela multidão de teatro, sabe o poder que ela tem. Perdemos um dos grandes, mas seu teatro, gigante, continuará a transformar muita gente ainda."

Fabrício Boliveira - ator


				
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Zé Celso Martinez e Fabrício Boliveira recriam a cena clássica do filme "Macunaíma", inspirado na obra de Mário de Andrade, vivida por Paulo José e Grande Otelo. Foto: acervo da Revista Serafina, da Folha de São Paulo.

“Conheci o trabalho do Zé Celso e do Oficina presencialmente no espetáculo Os Sertões. Ele recriou a história de resistência mais importante do Brasil, que se passa no Nordeste, e expandiu para todo o país em um espetáculo de seis horas, intenso, com múltiplas linguagens e de comunicação direta. Aprendi ali a força e a importância do teatro livre, político e popular . Zé nunca subestimou o povo. Em um dos nossos encontros, fui fazer aula de ioga no teatro Oficina com um grupo de imigrantes haitianos recém-chegados ao Brasil. Outra vez, e quase todas as últimas que estive lá, ele e seu grupo me despiram de roupas e me acolheram dentro de suas sagas brasileiras. Já tive meu corpo deflorado pelo pau dourado da Silvia, já fumei em cena com Zé, já compartilhei do vinho na plateia, já ouvi ele falar sobre o Itamar Assumpção para o meu trabalho de pesquisa e já fui o seu Macunaíma, nascido de suas entranhas desejadamente indígena. Seu último trabalho foi a adaptação do livro A Queda do Céu, do Davi Kopenawa. Zé me abriu parte do meu Brasil. Viva a Zé!!!!!”

Tony Reis - ator


				
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O ator baiano Tony Reis e o encenador Zé Celso. Foto: Acervo Tony Reis

“Eu fiz este ano 10 anos de Teatro Oficina. Quem me apresentou a Zé foi outro ator baiano, Ricardo Bittencourt. Eu pensei que seria apenas uma reunião normal, mas Zé já me recebeu com festa, com vinhos, já me chamando de Grande Otelo... E depois não parou mais essa conexão. Durante esses 10 anos, eu tive o prazer de fazer os melhores papéis, dentro do Teatro Oficina, através desse mestre, que sempre acreditou no meu potencial. Se eu não sou hoje um ator frustrado, que não conseguiu fazer nada, que veio da Bahia, com aquele sonho... A gente preto, que veio de uma comunidade pra tentar a vida em São Paulo... Se não fosse o Teatro Oficina, com Zé Celso, eu já teria desistido da minha carreira. Só tenho que agardecer”.

Fernanda Paquelet - atriz, diretora e iluminadora


				
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Fernanda Paquelet. Foto: Divulgação

“Na hora que eu recebi a notícia da morte de Zé Celso, eu tava dando aula. E na hora eu me lembrei que o lugar onde eu tava dando aula, o PAF 5, era o mesmo espaço físico onde nós montamos “As Dionisíacas”, que foi a turnê de Zé Celso, aqui em Salvador, que nós do Coletivo 4 fizemos a produção local. Foi em 2010 isso. (...) Depois disso, foram construídos o PAF 4 e o PAF 5, que hoje é justamente onde funciona a Escola de Teatro da UFBA. (...) Ou seja, no último espaço onde ele se apresentou em Salvador, brotou teatro.

Márcio Meirelles - encenador e dramaturgo


				
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Foto: Divulgação / Thiago Lima

“A primeira vez que eu vi o espetáculo de Zé foi em 1972, com a trilogia de “Os Pequenos Burgueses”, “O Rei da Vela” e “Galileu Galilei. Aquilo implodiu minha cabeça. No mesmo ano eu comecei a fazer teatro, impactado por estes e outros espetáculos daquela época, como o musical “Hair”. Comecei a fazer teatro universitário com um grupo da faculdade de Direito da UFBA. Me lembro também de outras passagens, quando uma vez Zé convidou o Bando de Teatro Olodum para uma participação em sua montagem de “Hamlet”, quando levamos “Medeamaterial” para São Paulo; e de uma vez que fui ver “As Bacantes” e fui espectador da vez a ser despido em cena (risos). Sempre fui muito bem recebido por ele no Teatro Oficina, sempre com muita alegria”.


				
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