Uma menina de 21 anos acaba de se mudar para uma nova cidade, Maranhãozinho, a 232 km de São Luís (MA). Ela estava, pela primeira vez, indo morar sozinha com o seu amor. Entre tantos sonhos que tinha, queria ser bombeira. Até que um dia, saindo do trabalho, ela se depara com o ódio. Em 10 de dezembro de 2023, Ana Caroline Sousa Campêlo foi brutalmente assassinada. O motivo: amar outra mulher. Por ser lésbica, Ana Caroline foi encontrada morta, numa estrada, com a pele do rosto, couro cabeludo, orelhas e olhos arrancados.
Numa quarta-feira, 13 de abril de 2016, em Ribeirão Preto (SP), Luana Barbosa, que trabalhava como terceirizada em uma empresa de buffet, havia saído de moto para levar o filho a um curso de informática. Luan, de apenas 14 anos, teve de assistir à mãe ser espancada até a morte por três policiais militares. O homicídio triplamente qualificado (crime cruel, por motivo torpe e sem possibilidade de defesa da vítima) foi, infelizmente, mais um caso de lesbofobia.
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Duas semanas já se passaram, e a polícia não tem nem suspeitos do lesbocídio de Ana Caroline. Três anos depois, os responsáveis pelo assassinato de Luana Barbosa seguem impunes. As duas vítimas, lésbicas, negras e desfeminilizadas, foram mortas pela violência racista, misógina e lesbofóbica que prevalece no Brasil, onde, segundo o Dossiê sobre Lesbocídio do Brasil de 2014 a 2017, o crime cresceu 237% nesses anos. Ler sobre esses casos absurdos e perceber o quanto eles são ignorados pela mídia e pelas autoridades é mais do que revoltante; vai no fundo das nossas almas e nos dilacera em mil pedaços. Estamos cansadas de sermos invadidas, machucadas e silenciadas por um sistema que nos humilha e nos nega o direito à dignidade e à vida.
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Protestos estão sendo realizados em todo o país exigindo a investigação da morte de Ana Caroline e dos demais casos, a implementação de um calendário nacional de enfrentamento ao lesbocídio e a criação de instrumentos de pesquisa e registro para a produção de dados sobre a população lésbica no Brasil. O Projeto de Lei nº 1.667/2023, que leva o nome de Luana Barbosa e tramita na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, prevê campanhas e ações públicas no combate à violência contra mulheres lésbicas.
Quantas de nós terão de morrer para que o lesbocídio (crime de ódio contra mulheres que amam mulheres) no Brasil seja tratado com a gravidade e urgência necessárias? Precisamos de pesquisas e políticas públicas específicas para a nossa proteção e defesa, especialmente para as caminhoneiras/desfem, que costumam ser as maiores vítimas. Chega de impunidade. Seguiremos lutando e resistindo para que a justiça seja feita, pela memória de todas as vidas sapatonas perdidas e para que amanhã não seja eu, você, sua filha, sua namorada, sua tia, sua mãe…
Gisele Palma
Gisele Palma
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