Para onde se olhe no ambiente do futebol, é cada vez mais onipresente a exposição de marcas de casas de apostas, charmosamente chamadas de bets. Seja no nome que batiza os estádios, estampada nos uniformes dos jogadores e nos intervalos comerciais, o poderio desse modelo de negócio só se expande. Mas esse crescimento das apostas esportivas realizadas através da internet mostra que é preciso urgentemente fazer uma reflexão aprofundada sobre o vício em jogos online, pois há sinais claros de uma realidade muito preocupante a nos rondar. Porém, a relação entre futebol, apostadores e casas de apostas é muito mais antiga do que parece, e tem seus primeiros relatos vindos há mais de 100 anos.
Os impactos deste tipo de “entretenimento” são tão significativos na saúde mental que já é possível compará-los à dependência de substâncias psicoativas, como álcool e drogas. O Jogo Compulsivo é considerado uma doença pela Organização Mundial de Saúde (OMS), sob o CID F63.0, e a Mania de Jogar pelo CID-10-Z72. Segundo pesquisas realizadas pelo ANJO - Ambulatório do Jogo Patológico do Hospital das Clínicas de São Paulo, a condição afeta de 1,5 a 3,5% da população. Mas o percentual vem crescendo com o uso das plataformas digitais.
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O ato aparentemente ingênuo de jogar e apostar pode atingir um outro nível e trazer características de comportamento compulsivo, como a ansiedade, e sinais de dependência que impulsionam o indivíduo a repetir obsessivamente a ação de continuar jogando, mesmo percebendo que há perdas cada vez maiores. Como consequências mais graves podem surgir o isolamento social e a desconexão emocional e afetiva do jogador com o mundo ao seu redor, os prejuízos financeiros crescentes e as rupturas nas relações pessoais, familiares e profissionais.
Além das questões em nível individual, a combinação dos jogos online com apostas esportivas visando obter ganhos financeiros está se tornando também um problema social que vem exigindo, por parte dos poderes públicos, cada vez mais atenção e medidas eficazes de enfrentamento. Pesquisadores sobre o assunto reforçam que é preciso investir em campanhas educativas já nas escolas e em todas as mídias possíveis, assim como promover ações preventivas para evitar que o vício se dissemine, disponibilizar tratamento pontual via sistema de saúde pública para os que sofrem com o vício em jogos online e manter um acompanhamento próximo através de redes de apoio.
Por ter se tornado uma questão de saúde pública, os estudiosos apontam a necessidade de regulamentar com urgência os jogos online para minimizar os riscos de vício, proteger a estrutura do próprio sistema de saúde e possibilitar ao dependente um tratamento com ajuda profissional especializada e uma rede de suporte na recuperação, incluindo o acompanhamento psicológico e as oficinas de reabilitação, com o envolvimento dos familiares.
Especialistas no assunto relatam que há uma mudança no perfil dos jogadores que buscam ajuda, com aumento significativo de casos especialmente entre os jovens, muito em função da alta conectividade e da exposição intensa aos aparelhos celulares. A gravidade da dependência em jogos online e suas consequências devastadoras, como a venda de bens e a tomada de empréstimos para sustentar o vício são cada vez mais comuns. Em termos de saúde, sabe-se que todo este processo pode levar a transtornos mais sérios, como ansiedade descontrolada, depressão e, em casos extremos, até suicídio.
Pelo seu caráter ardiloso e progressivo e com os prejuízos crescentes em diversas áreas da vida, faz-se necessário procurar por ajuda o mais rápido possível, principalmente para aqueles que já se perceberam como vítimas dessa condição. Há serviços de acolhimento que podem ser acionados nos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), com orientações de ajuda e suporte, através da intervenção de profissionais como psicólogos e assistentes sociais em oficinas terapêuticas. Para quem busca uma rede de apoio e recuperação, uma importante dica é procurar os Jogadores Anônimos, uma irmandade de homens e mulheres que se reúnem em grupos com o objetivo de manterem-se abstinentes do jogo e restituírem uma maneira normal de pensar e viver.
Sílvio Tudela
Sílvio Tudela
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