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MÚSICA

"O que mais tem me impressionado é o pagodão", diz Caetano

Cantor falou ainda da amizade com Gil, do show com Teresa Cristina e dos verões em Salvador

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Redação iBahia

18/01/2017 às 14:57 • Atualizada em 31/08/2022 às 15:26 - há XX semanas
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Presença constante no Verão em Salvador, o cantor e compositor Caetano Veloso, 74 anos, já circula há um bom tempo pela cidade, enquanto aguarda a estreia por aqui do elogiado show que faz em parceria com a cantora carioca Teresa Cristina, 48 anos. As apresentações acontecem sexta e sábado, a partir das 19h, na Concha Acústica do Teatro Castro Alves.
A turnê que marca o primeiro projeto internacional dos artistas juntos é batizada de Caetano Apresenta Teresa e chega depois dela encantar o Brasil com o show Teresa Canta Cartola, em que faz uma homenagem ao grande poeta de Mangueira.
Após assistir à estreia do show, em janeiro de 2016, com Teresa no palco acompanhada apenas pelo violão de Carlinhos Sete Cordas, Caetano escreveu: “A tranquilidade com que cada acorde escolhido sugere a entrada da voz de Teresa refina a alma do ouvinte. E Teresa cresce a cada melodia, a cada palavra, a cada segundo. Todos os brasileiros deveriam ver e ouvir o que se passou no Theatro Net Rio naquela noite”. O show na capital baiana é uma realização da UNS Produções, com produção local da Ivanna Soutto Produção de Conteúdo e da produtora Tereco Lino.
Em entrevista via e-mail para o CORREIO, Caetano fala de como conheceu e se aproximou da sambista carioca e demonstra todo o carinho que tem pela artista. Também fala carinhosamente de sua amizade com Gilberto Gil de quem é amigo irmão há 50 anos e de como ele o influenciou em sua carreira durante todo esse tempo. Emocionado, Caetano mostrou-se preocupado quando Gil ficou doente com problemas renais e procurava sempre saber como estava o amigo. Revelou que ficou feliz quando soube, através de Bem Gil, que o amigo está compondo bastante.
Admirador da axé music e um dos destaques do documentário de Chico Kertész que conta a história dessa cena musical que conquistou o Brasil, Caetano elogiou a aparição do chamado pagodão, tecendo elogio ao Harmonia do Samba de Xanddy e companhia. E faz uma declaração de amor a Salvador e ao Verão na Bahia, que ele faz questão de curtir e celebrar esse clima de alegria na velha São Salvador. A seguir a entrevista na qual o mestre Veloso está cada vez mais Caetano.
Você sempre acolhe novos talentos e até grava discos e faz shows com eles. Está sempre interagindo com artistas da nova e da velha geração. Agora, você está fazendo show com Teresa Cristina, uma artista de talento indiscutível. Como foi essa aproximação com ela?
Me aproximei de Teresa quando estava fazendo o disco Zii e Zie. Já faz alguns anos. Eu tinha ouvido uma gravação dela do meu samba Gema e tinha gostado muito. Aí pedi a ela que cantasse comigo na série de shows que eu fazia então, um semanal que eu chamei de Obra em Progresso. Conhecê-la de perto me deixou maravilhado com a cultura de música popular que ela tem e com a inteligência com que ela fala disso.
Como tem sido essa química entre vocês dois?
Agora, quando ela ia fazer o show com as músicas de Cartola, conversei com ela na casa de Paulinha Lavigne (que a está empresariando e orientando). Foi uma conversa breve. Eu me queixava da neutralidade das interpretações dela, da falta de nuance e de entrega emocional. Quando fui ver o show, sentado na plateia, fiquei maravilhado com o que ela fazia junto ao violão de Carlinhos Sete Cordas - e com as mostras de inteligentíssimo aproveitamento das ideias surgidas na nossa conversa. Quando passamos a fazer um show duplo em conjunto - pensado mais para divulgar o CD/DVD que foi lançado internacionalmente do Teresa Canta Cartola - começamos a ter muito mais tempo para conversar sobre música e tudo o mais. Teresa é uma grande pessoa.
Há projeto de transformar esse show num CD ou DVD?
Esse show nasceu da existência do CD/DVD de Teresa. Agora, no segundo dia da Concha, vai ser transmitido pelo canal Bis. Pode ser que o material depois venha a ser comercializado. Mas não tenho planos de fazer nada assim. O mais bonito para ser gravado já o foi: as canções de Cartola com Teresa e Carlinhos. Minha parte tem um repertório interessante, todo diferente do show com Gil. Mas não sei se tem qualidade para registro. Eu preciso treinar mais meu violão e minha voz não é mais a mesma de quando eu tinha 36 anos. Bem, pode ser que as canções que fazemos juntos quando a plateia pede bis sejam material bom para ser gravado.
Esse seu comportamento de sempre apoiar novos valores ficou também muito evidente na chamada axé music, que teve seu apoio total. Passados 30 anos, como Caetano Veloso vê essa música que nasceu na Bahia e ecoou pelo Brasil? E quem destacaria em toda a cena?
O que mais tem me impressionado nos últimos anos é o pagodão. Depois do magnífico Harmonia do Samba, vieram Fantasmão, Parangolé, Psirico, Canário e outros cujos nomes não me vieram à mente agora, todos fazendo experimentações com a base de samba-de-roda ou de chula que marcou essa entrada do samba no Carnaval da Bahia quando surgiu o Gerassamba que virou É o Tchan. Vi o filme Axé - Canto do Povo de um Lugar. Fico orgulhoso ter título de canção minha como subtítulo de um documentário sobre esse fenômeno que me apaixona desde quando ainda era um embrião. Mas a parte final do filme mistura certas queixas erradas com um fácil diagnóstico de decadência, sem mostrar o que há de importante no mundo da chula eletrificada. Ainda bem que Ivete desqualifica as queixas e Letieres Leite tem a lucidez de reconhecer que algo que chegou onde o axé chegou não morre mais. O repertório relevante do Carnaval carioca teve força massiva nacional dos anos 30 aos 60. Isso com a aprovação getulista do samba e a celebração permanente pela imprensa. O axé (que ganhou esse nome num dos gestos destrutivos dos seus inúmeros detratores) resistiu à neurose, ao desrespeito e ao pseudo-elitismo por mais de três décadas e ainda está aí, ajeitando sua convivência com certa aprovação social, refazendo o samba e canibalizando arrochas e sertanejos. Repassando na lembrança e vendo o filme, que é exuberante como o tema exige, fica difícil destacar personalidades sem encher toda a página do jornal com nomes e sem cometer injustíssimas omissões.
Há 50 anos, você e Gil são dois irmãos “siameses” que conviveram e convivem nos bons e maus momentos. Inclusive, agora, quando Gil enfrentou problemas de saúde. O que Gilberto Passos Gil Moreira representa na vida de Caetano Emanuel Viana Teles Veloso?
Gil foi e é meu mestre desde que o vi na TV. Ficamos amigos apaixonados logo que Roberto Santana nos apresentou. Tomei coragem de tentar aprender a tocar violão com ele. Imitava as posições que ele fazia e ia entendendo as relações entre os acordes. Às vezes, perguntava uma ou outra coisa a respeito do sentido das harmonias. Mas só às vezes. Ele me ensinava por ser tão da música e estar tão perto. O show que fizemos juntos por mais de um ano resultou grandioso por causa disso. Quase não ensaiamos. Nem fizemos uma estrutura de show bem pensada. Estreamos inseguros. Mas o conteúdo real de nossa relação terminou por se sobrepor a tudo. Quando ele ficou doente (logo antes de nossa apresentação aqui em Salvador) fiquei muito preocupado. Mas depois que estive com ele e com alguns dos médicos que o acompanham, me tranquilizei mais. Quando ele teve de suspender o show de nossa volta ao Rio, depois de todas as viagens e descansos, voltei a ficar apreensivo. Fui à casa dele e de novo me tranquilizei. Faz pouco estive com ele numa festa e achei que ele estava muito bem, animado, falando muito, como de costume, conversando de pé. Fiquei feliz. Agora ouvi de Bem que ele está compondo bastante e já tem um bom número de novas canções. Eu, que não tenho composto nada há bastante tempo (a última música que escrevi foi Não Sei Amar, para a nora dele, Ana Claudia Lomelino, cujo disco já saiu há meses), fiquei maravilhado com a notícia. Gil é o gênio da grandeza musical que tomou conta do Brasil no final dos anos 1950 e que veio para tão perto de mim! Sem ele, eu não estaria fazendo música.
Desde o início dos anos 1980 quando frequentávamos sua casa, eu, Marcelo Schwab, Derinho Carvalho, nós só considerávamos que o Verão estava começando quando você chegava (risos). Até hoje, eu e muita gente pensamos assim. E você continua personificando e curtindo o Verão principalmente na Bahia. Caetano, Bahia e Verão são inseparáveis?
Felizmente sim. Eu sou louco por Salvador e adoro vida de Verão. O Verão em Salvador é muito gostoso em janeiro: é o único mês que não tem chuva quase nenhuma (aqui chove muito o resto do ano todo), a cor do céu e do mar é deslumbrante, o ânimo das pessoas é gostoso, e tem a brisa.

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