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Claudio Marcelo Reis ao lado de um desenho de Charles Chaplin que fez aos 11 anos |
Quando menino, em Feira de Santana, ele já era fascinado por desenhos. Esse interesse o levou à faculdade de Desenho Industrial, na Universidade Federal da Bahia, e também a conquistar um lugar de destaque em Hollywood. O ilustrador baiano Claudio Marcelo Reis é atualmente o cara que desenvolve os cartazes de campanhas internacionais para os filmes da Disney. Ele vive em Los Angeles e sempre que pode dá uma passada em Salvador para rever a família. Em uma dessas visitas, encontrou o iBahia para um papo sobre cinema, arte e criatividade. Dá uma olhada: iBahia - Como você começou sua carreira internacional em Los Angeles?Claudio Marcelo Reis - Eu tinha feito uma viagem de passeio, em 2005, ao Canadá e aos Estados Unidos. Nessa viagem, um amigo meu que é fotógrafo viu meu site e disse: “Conheço uma empresa que está procurando por um profissional com o seu perfil”. Eu faço um estilo de ilustração que parece fotografia, o que os americanos chamam de hiperrealismo. Ele disse ainda: “Tem uma indústria grande aqui de publicidade para cinema”. Fui para uma entrevista e eles pediram para fazer uns testes. O dono da empresa nem acreditava que eu fizesse o trabalho e me deu os personagens da Disney
Lilo & Stitch. Desenhei alguns atores para um poster e, no fim do dia, ele disse que tinha uma proposta de trabalho. Também estava disposto a patrocinar meu visto de trabalho para que eu me mudasse para os Estados Unidos. Eles foram bem convincentes e eu acabei optando por aceitar o desafio. Mudei para lá, definitivamente, em março de 2006 e, em julho, tive o meu primeiro poster para o filme
Lucas, Um Intruso no Formigueiro, primeira animação da Warner.
iBahia - Em Los Angeles, está a indústria do cinema e existem agências de publicidade focadas neste segmento. Como a divulgação dos filmes é tratada lá?CMR - A gente trata o filme como um produto. É como se estivesse fazendo propaganda de um perfume, de uma marca ou empresa. Tem tanto retoque, tanto corta aqui e corta ali... Você tem que fazer tudo parecer bonito e real e, no final, acaba virando um trabalho de ilustração. É um misto de fotografia e ilustração com efeitos especiais. Para mim isso foi apaixonante e eu me entreguei de corpo e alma.
iBahia - Quando se fala em Hollywood, as pessoas sempre pensam em glamour. Como é trabalhar em um mercado extremamente exigente? Quais foram suas dificuldades de adaptação?CMR - No primeiro ano, a língua foi uma dificuldade. Às vezes, era complicado assimilar tudo o que estava acontecendo nas reuniões. Com dois anos morando lá, soube que o governo americano reconhece quando a pessoa tem um talento que eles consideram “extraordinário”. Eu fiz uma petição para um
greencard como um artista de talento extraordinário, que é a classificação que a migração exige. A empresa em que eu estava trabalhando queria patrocinar o
greencard, mas eu tinha que criar um “acordo de fidelidade”, um processo que dura de cinco a seis anos ou mais. Não quis isso porque sempre fui uma pessoa muito livre. Em 2009, saiu meu processo e fiquei feliz, porque era um brasileiro tendo reconhecimento lá. Tive cartas maravilhosas de clientes, como a 20th Century Fox e a Disney. No final de 2009, também recebi o convite de uma outra agência, que é onde eu trabalho atualmente, a Five 33, com base em Londres e Los Angeles. Fui contratado como diretor de criação para cuidar da conta da Disney internacional. Hoje sou chefe dos americanos.
iBahia - Como é o dia a dia da criação?CMR - Quando a gente recebe o projeto da campanha, vem com roteiro,
briefing e com algumas partes do filme. A criatividade depende de você conhecer tudo para saber para quem vai comunicar. O interesse dos estúdios, nossos principais clientes, é que o filme venda e faça sucesso. Um exemplo que eu acho muito bom foi o de
Alvim e os Esquilos. A gente criou uma linguagem nova para o visual dos personagens. A agência tinha um medo grande: “Esses esquilinhos, que falam com uma voz engraçada...será que as pessoas vão gostar?”. Então, criamos um visual
happer para eles e isso deu uma linguagem nova e a campanha teve bastante sucesso. Uma outra que teve ainda mais sucesso foi a campanha do
Toy Story 3. Procuramos trazer o lado mais humano que qualquer um daqueles brinquedos pudesse ter.
iBahia - Essa foi sua campanha de maior sucesso e mais desafiadora em Los Angeles? CMR - A campanha internacional de
Toy Story 3 era um desafio muito grande e eu fui diretor de criação para quase todos os países fora dos Estados Unidos. O
Toy Story já era bem-sucedido nos Estados Unidos, tanto o primeiro quanto o segundo, mas internacionalmente, não tinha tanto sucesso. O
Toy Story 3 foi um recorde, um filme de animação de maior sucesso até hoje, indicado ao Oscar como melhor filme, isso me deixou bastante orgulhoso. Tive outras campanhas, logo depois. Fiz o filme que no Brasil chama-se
Enrolados, a história de Rapunzel. O desafio desse era que não fosse um filme só com cara de princesa. A mulher hoje é moderna, independente e vai atrás do que quer. Trabalhamos muito isso com a personagem, que era determinada. Estava presa na torre, mas quando saia era uma aventureira, dona de si, mas preservando toda a sua feminilidade e o seu encanto. Fiz duas peças principais. Uma foi para a campanha internacional que veio, inclusive, para o Brasil. Tiveram também peças exclusivas para França e Japão. O Japão é um país que quase sempre faço campanhas exclusivas.
iBahia - Tem algum país onde essa comunicação é mais difícil? CMR - São linguagens diferentes, movidas por elementos relacionados à cultura do lugar, à identidade do povo. O Japão é um país que tende a solicitar, em tudo o que a gente faz, desde animação até os filmes
live action ( filmes de animações com atores de verdade), um apelo mais emocional. Um desafio que tive em relação ao Japão foi o relançamento de um filme dos anos 80, o
Tron, sobre um jogo de computador. Foi interessante porque era um filme frio e extremamente masculino, com coisas de computador, motocicleta, e o objetivo era tornar o mais emotivo possível e também atrair o público feminino.
iBahia - Toda vez que você recebe um projeto, você vê as cenas antes de criar a campanha? CMR - Nem sempre a gente tem a oportunidade de assistir o filme, principalmente, porque os de animação ainda estão sendo feitos. Dos filmes
live action, a gente tem que ler o
script para se basear. Os estúdios hoje têm um medo muito grande de que as coisas vazem, por isso, muitas vezes, para assistir, a equipe precisa se deslocar até o estúdio.
iBahia - Seu trabalho é também de muita pesquisa, inclusive cultural, para conseguir traduzir os filmes nos cartazes para cada país... CMR - Tenho que estar ligado no que está acontecendo no mundo. Estava fazendo a campanha para o
Piratas do Caribe 4 somente para o Japão, e tive que mudar muitas coisas por causa da tragédia que aconteceu lá. Não seria de bom tom manter, porque o conto se passa no mar. Estar atualizado com o que está acontecendo no mundo é muito importante para que a campanha tenha efeito. Na comunicação visual, você precisa ter um cuidado muito grande com mensagens dúbias.
iBahia - Desde criança você já desenhava personagens de filmes?CMR - Eu sempre desenhei. Tinha meu mundo, minhas histórias – tanto que agora estou trabalhando em uma
grafic history minha, e que espero lançar no ano que vem. Essas coisas vem desde a minha infância, eu adorava assistir filmes de fantasia, desenhos animados, concursos de miss, ou seja, tudo o que era muito visual. Sempre fui preocupado também com os detalhes, eles falam mais do que o todo.
iBahia – E quando entrou para a faculdade já tinha em vista trabalhar com cinema? CMR - Sempre fui ilustrador. Nunca tinha pensado nisso, até porque no Brasil o mercado e a indústria cinematográfica estão crescendo agora. Espero que alguém que saiba que estou fazendo esse trabalho me convide.
iBahia - Você quer voltar para o Brasil? CMR - Voltar para residir agora não está nos meus planos, mas quero criar mais vínculos com o Brasil. Vejo que o cinema tem crescido bastante e acho importante trazer para cá o conhecimento que eu obtive lá esse tempo todo. O cinema aqui está evoluindo e o pensar da publicidade para isso, também. Los Angeles é a capital do cinema e lá existem agências que vivem em torno disso, então, existe todo um pensar e um processo criativo em torno do filme para que seja um sucesso. Acho que as pessoas ainda estão descobrindo isso aqui.
iBahia - Existe alguma campanha que você gostaria de ter realizado? CMR - Uma campanha que eu adorei foi a do filme
Three Hundred (300), a história dos 300 espartanos. Achei fantástica. O Rodrigo Santoro está no filme e, na época, estava tão apaixonado pela campanha, que assisti e nem me toquei que era o Rodrigo. Ele estava muito diferente e só depois soube que ele estava no filme, que tem uma direção de arte belíssima. Achei que a campanha foi bem-sucedida.
iBahia - A trilha sonora é um dos elementos mais fortes no cinema. De alguma forma, isso interfere em seu trabalho na criação das campanhas para os filmes? CMR - Geralmente, a gente não tem conhecimento da trilha antes, porque eles não revelam. Com
Toy Story 3 teve uma coisa interessante. Teve a música
Take My Breath Away, do
Top Gun (filme dos anos 80 com Tom Cruise), que é do momento em que a Barbie encontra o Ken. Quando eu estava assistindo ao filme, antes de trabalhar com a campanha, aquilo achei o momento mais histérico. Lembro que foi uma música que fiquei ouvindo para pegar a piada, o espírito do que estava se querendo dizer. Quando trabalhei com
Alvin, não ouvi as músicas do filme, mas ouvi muito músicas de crianças. Até já me peguei ouvindo Balão Mágico, quando estava criando uma dessas campanhas para a Disney. Acho que a música tem essa capacidade de trazer certas emoções no momento em que você está criando. Poderia até dizer que música é um fator essencial no meu trabalho.
iBahia - Além das campanhas da Disney, o que mais você faz hoje em Hollywood? CMR - Agora estou trabalhando em um projeto pessoal com uma amiga minha de Nova York, que é fotógrafa. É uma exposição falando sobre o início da minha vida em Los Angeles. Quem já viu o filme
Crash, vê ali o maior exemplo do contraste dessa cidade. Hollywood vai do alto luxo ao lixo. Essa minha amiga veio de Nova York para Los Angeles e fizemos umas fotos. O pano de fundo da exposição serão as fotos e as imagens de pessoas que vão ser ilustradas por mim. A minha intenção é lançá-la no final deste ano ou início do ano que vem, nos Estados Unidos. Espero poder trazer para o Brasil.
Veja os traillers oficiais dos filmes ilustrados por Claudio Marcelo Reis: ENROLADOS
[youtube Nj-Y37_Av2E]
TOY STORY 3[youtube 9Etr67WEyq8&feature=fvst] TRON [youtube N8fj9WvmHhI&feature=fvst] PIRATAS DO CARIBE 4[youtube haenBC_xPnc]