A cantora Teresa Cristina celebra 25 anos de carreira em plena forma e com muitas ideias na cabeça. Revelada em 1998, quando cantava no bar Semente, na Lapa, bairro do Rio de Janeiro, a artista de 55 anos construiu uma trajetória de sucesso no samba, tendo homenageado ícones como Paulinho da Viola e Cartola.
Em 2015, ao lado de Moacyr Luz e Cláudio Russo, foi premiada com o Estandarte de Ouro pela composição do samba-enredo "Candeia! Manifesto ao Povo em Forma de Arte!", da escola de samba Renascer de Jacarepaguá.
Leia também:
Em 2020, no entanto, Teresa ganhou um novo título para sua coleção, tornando-se "a rainha das lives". As transmissões ao vivo que fez durante o auge da pandemia de Covid-19, com performances musicais, bate-papos e reflexões, atraíram grande público e renderam a ela o prêmio de "Artista do Ano" da Associação Paulista de Críticos de Arte (APCA).
Em entrevista ao Mundo GFM, a artista refletiu sobre a importância da música naquele momento, além de fazer um balanço da trajetória e apontar a constante renovação do samba. A cantora ainda disse ter uma forte ligação com a Bahia, mas considerou que "canta muito pouco" no estado.
Confira:
Mundo GFM: Você está completando 25 anos de carreira neste ano. Qual o balanço que você faz dessa trajetória desde o início até aqui?
Teresa Cristina: Eu acho que o balanço é positivo, eu tenho me observado e percebo como minha relação com o palco, os músicos e as interpretações melhoraram muito. Me sinto muito feliz com isso e espero continuar crescendo.
MGFM: Como você vê as transformações pelas quais o cenário do samba e o mercado da música passaram nesse período?
TC: Eu acho que muita coisa mudou. Algumas coisas continuam as mesmas, com relação à execução das músicas, à exposição dos artistas. Quando eu comecei minha carreira, eu gravava álbum, se lançava um álbum inteiro, que contava uma história. Hoje em dia as pessoas lançam singles. A música não era o Spotify, o Deezer, o Google Play. Existia gravadora, o CD físico, hoje em dia tudo virou digital. Antes você pagava a capa do CD, a prensagem... hoje em dia você não paga mais nada e recebe muito menos do que recebia antes. Ninguém hoje vive de royalties, a gente vive de shows.
Quanto ao samba, acho que a voz feminina no samba cresceu muito. Temos muitas mulheres no samba e acho que vão aparecer mais. Pelo que tenho visto nos lugares onde eu passo, a gente ainda vai conhecer muitas mulheres sambistas. O samba no Rio de Janeiro mudou muito o cenário, eu cantava em casas específicas, no Carioca da Gema, no Semente, no Centro Cultural Carioca. Hoje o samba está na rua, na Praça Tiradentes, em outros espaços do Rio de Janeiro. Temos várias rodas de samba acontecendo em vários pontos da cidade. O samba está muito vivo no Rio e no Brasil. Teresa Cristina
MGFM: Em 2020, você escreveu um novo capítulo em sua trajetória com as famosas "lives", que agregavam milhares de pessoas durante o auge da pandemia de Covid-19. Quais aprendizados e lembranças ficaram deste período?
TC: Tenho muitas lembranças boas das lives que fiz. Não esquecendo que durante essas lives a gente estava passando por uma situação muito ruim no mundo, especialmente no Brasil. Eu aprendi que em situações como essa a gente precisa olhar para dentro da gente, enxergar a nossa verdade, o nosso ponto de força, enxergar onde a gente pode se apoiar. E eu me apoiei na cultura brasileira, na música brasileira. A música brasileira me ajudou a passar pela pandemia, e por conta da qualidade musical do Brasil, dos compositores, dos artistas que eu lembrei nas lives, eu pude passar por essa pandemia fazendo o que eu gosto, que é cantar, pesquisar sobre música brasileira, falar de música. Acho que o principal aprendizado para mim foi esse. Em momentos tenebrosos, a gente precisa relaxar um pouco, ficar perto de quem a gente gosta, proteger quem a gente gosta. São muitas lembranças ao longo de pouco mais de um ano de lives.
MGFM: Em entrevista à revista Veja, você contou que planeja lançar seu primeiro disco inteiramente autoral. Como está o processo de produção? Já existe data prevista de lançamento?
TC: Esse disco autoral vai ser lançado em 2024. Como está o processo? Ele está em processo de produção (risos), esse processo é uma coisa muito abstrata. Mas ainda não tenho data prevista pra lançar.
MGFM: Você já fez discos inteiramente dedicados a nomes como Paulinho da Viola, Noel Rosa e Cartola. Existe algum compositor que você ainda quer homenagear?
TC: O próximo compositor que eu gostaria de homenagear é o compositor Zeca Pagodinho. Ele é um grande intérprete, um grande nome do samba, um grande brasileiro, mas eu ando de olho no que o Zeca fez como compositor. E é uma obra muito bonita, acho que as pessoas vão ter muitas surpresas.
MGFM: No ano passado, você recebeu o título de cidadã baiana, concedido pela Assembleia Legislativa da Bahia. Qual a sua relação com a Bahia?
TC: A Bahia é a terra do meu pai. Meu pai era de Cachoeira e eu tenho uma relação de amor com a Bahia, apesar de cantar muito pouco na Bahia. Estou sempre reclamando que canto muito pouco, acho que a Bahia me convida pouco para o amor todo que eu tenho por ela. E esse título de cidadã baiana me emocionou muito. É uma pena que no mesmo dia em que eu recebi o título, perdi meu irmão, que faleceu no Rio de Janeiro. E aí ficou esse trauma na minha cabeça, sabe? Uma data em que eu me emocionei, me lembrei do meu pai, uma data que seria inesquecível para mim, teve essa tristeza que foi saber do falecimento do meu irmão.
MGFM: Você acompanha o cenário da música brasileira atualmente? O que você gosta de escutar?
TC: Eu ouço muita coisa. Estou fazendo essa pesquisa da obra do Zeca como compositor, então tenho escutado muito os álbuns dele, procurando composições dele em álbuns de outros artistas, mas um artista que tem chamado muito minha atenção se chama Vinny Santa Fé. É um artista que está fazendo uma coisa nova no samba. E essa palavra "nova" no samba tem muito significado, porque o samba vem se transformando há séculos, mas o trabalho do Vinny tem me emocionado muito. Ele é um artista no qual precisamos ficar de olho, porque ele está sempre fazendo uma coisa boa.