É muito mais que tratar doenças com plantinhas. É com essa frase que a ginecologista e obstetra Bel Saide começa a explicar em suas redes sociais o que é a Ginecologia Natural. Numa conversa pelo Parque Lage, no Jardim Botânico, Zona Sul do Rio, a carioca de 38 anos, que se formou em Medicina na Uerj em 2005, conta como esse movimento pode ser transformador na vida de uma mulher. Solteira e mãe de um menino de 15 anos, Bel lança na próxima semana o e-book “Ginecologia sem hormônio”, no site, e tem feito palestras em várias cidades do país, reunindo mulheres que buscam um novo olhar sobre o próprio corpo.
A Ginecologia Natural é um movimento ou especialidade?
É um movimento que está vindo das mulheres da América Latina, principalmente Chile, Argentina e Uruguai. Não é uma especialidade médica reconhecida. A Ginecologia Natural é, antes de tudo, a busca do resgate do conhecimento e da admiração do funcionamento do corpo feminino e seus processos naturais. É um novo olhar sobre a saúde da mulher.
Esse movimento vem atrelado ao crescimento do feminismo?
O crescimento da Ginecologia Natural tem muita relação com o crescimento do feminismo. As mulheres latino-americanas têm esse movimento de resgate dos saberes ancestrais, de mulheres de aldeias, do sagrado feminino.
O que é o sagrado feminino?
É uma busca das mulheres de se conectarem com sua essência feminina, com a força do feminino. A conexão com a terra, com a lua, com os saberes femininos, com uma essência que foi perdida. A mulher moderna, contemporânea, se desconectou dessa essência feminina, da sua natureza cíclica. Para entrar no mercado de trabalho e ser autônoma, teve que provar ser capaz de fazer as tarefas dos homens. Ela precisou se afastar da sua natureza cíclica, do ciclo menstrual. Coincidentemente ou não, isso veio com o “bum” das pílulas anticoncepcionais, na década de 60. Talvez o elo tenha se perdido aí. Ou até muito antes, lá na caça às bruxas, quando o saber feminino passou a ser considerado perigoso. Hoje, sabemos que nossa essência feminina não nos enfraquece, mas nos fortalece.
Como a Ginecologia Natural vê a contracepção e hormônios?
As pílulas anticoncepcionais tiram a natureza cíclica da mulher. Quando surgiram, foi positivo porque permitiu a mulher sair de casa, controlar o número de filhos que ela ia ter e poder trabalhar. Mas atualmente tem se visto malefícios físicos e emocionais com o uso constante da pílula. Além da questão das tromboses, do aumento de risco de acidentes vasculares, há o malefício de tirar a mulher do ciclo menstrual dela. O anticoncepcional regula de forma artificial o ciclo. Na Ginecologia Natural, estimulamos a mulher a conhecer o seu ciclo menstrual, a entender as alterações que ele causa e a não enxergar isso de forma negativa, como se fosse vítima do ciclo menstrual e, sim, aprender a girar com ele de uma forma harmônica.
Isso aumenta o seu conhecimento sobre o próprio corpo?
Um pilar importante da Ginecologia Natural é o autoconhecimento, se tornar uma especialista em você mesma.
As doenças ginecológicas são resultado de um desequilíbrio?
Sim. Tenho muitas pacientes com candidíase de repetição que chegam dizendo já terem tomado de tudo e querem uma planta para se tratar. É preciso parar e analisar o que está por trás daquilo. Ginecologia Natural não é substituir remédio por planta. E se fizer apenas isso, a mulher vai continuar com o problema. É preciso se reequilibrar. Isso inclui alimentação, atividade física, olhar para as emoções. A Ginecologia Natural é um olhar holístico, que integra diversas terapias. Eu atendo com fitoterapia e aromaterapia. Mas pode-se tratar com medicina tradicional chinesa, florais, ayurvedica e psicoterapia.
A Ginecologia Natural é contra o uso de remédios alopáticos?
Acreditamos nos tratamentos naturais como mais positivos, mas a alopatia pode ser usada se for desejo da mulher. A paciente vai decidir o que ela deseja e saber o seu limite.
E quanto aos hormônios?
A Ginecologia Natural é contra o uso de hormônios. Como ginecologista, digo que podem acontecer casos específicos de doenças mais graves em que pode ser necessário o uso de hormônios. Não tenho uma visão radical de nunca, jamais. Mas o uso está banalizado. A pílula passou a ser oferecida a praticamente todas as mulheres como única opção contraceptiva e solução para qualquer doença ginecológica que curse com alteração da menstruação, como cisto de ovário, endometriose, ovário policístico, cólica, TPM e até espinha. Tudo se trata com anticoncepcional.
Por que você diz que pílula não é tratamento?
Se você tem, por exemplo, endometriose, e parar de tomar a pílula, a doença volta. Ela não cura.
Quais os métodos contraceptivos mais indicados?
A contracepção natural é conhecer o ciclo menstrual e conseguir perceber, a partir de alterações que temos ao longo do ciclo — secreção vaginal, pele, humor, disposição, sono, sociabilidade, temperatura corporal — quando se está fértil. É perfeitamente possível, não é difícil. Nós simplesmente não fomos educadas para isso. E existem os métodos não hormonais: camisinha, diafragma e DIU de cobre.
Como funciona a vaporização do útero (quadro acima)?
O vapor da erva colocada na água quente ascende pela vagina até o útero. A mucosa vaginal tem grande capacidade de absorção. O princípio ativo da planta é absorvido e cai na corrente sanguínea. O calor dilata os vasos e melhora a circulação sanguínea no local, potencializando a ação das substâncias utilizadas. O efeito depende da erva. Há plantas que são anti-inflamatórias, antifúngicas, bactericidas, antissépticas. Além disso, elas têm força vital, energia.
Qual o poder do alho na cura de doenças ginecológicas?
Ele tem propriedades bactericidas, fungicidas e antissépticas e pode ser usado tanto por via oral como intravaginal para tratar corrimentos, especialmente a candidíase. Você descasca um dente de alho, amarra uma linha nele e introduz na vagina durante a noite. É muito eficaz.
Quais as ervas mais poderosas para a saúde feminina?
Usamos diversas ervas,dependendo do que estamos precisando. Para irregularidades menstruais, há a artemísia, a erva da mulher, que a equilibra energeticamente. A camomila pode ser usada em banhos de assento contra vaginites e, em chás, para cólica e TPM. São sempre tratamentos mais lentos. Dias antes da menstruação, começa a tomar o chá. Malva e barbatimão são usados contra candidíase.
O uso de absorventes descartáveis faz mal?
Eles apresentam compostos químicos maléficos à saúde menstrual, aumentando o fluxo menstrual e abafando a vagina. Essas substâncias provocam reações químicas, com produção de gases que aumentam a incidência de infecções. Quando a mulher faz a transição para o uso dos coletores e absorventes de pano, passa a ter outra relação com o sangue dela e sentir que não é nojento. Não tem cheiro. Essa transformação que a Ginecologia Natural prega em diversos aspectos é fundamental.
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Redação iBahia
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