Foto: Acervo iBahia Ter um acervo, significa manter um conjunto de bens que representam um patrimônio. Hoje, o Preta Bahia te apresenta um casal de professores, que cuida de um acervo de bens culturais e históricos do Subúrbio Ferroviário de Salvador - o Zé Eduardo e a Vilma, criadores do Acervo da Laje. Vilma tem 54 anos e por problemas de saúde começou a andar somente aos 10 anos. A partir daí seus passos a levaram a explorar a comunidade que nasceu e cresceu, a mesma de Zé Eduardo. "Pra mim foi uma liberdade, começar a andar com 10 anos e conhecer o bairro que eu moro. A partir desse momento eu passei a amar o bairro", relembrou a professora. Para Zé, Vilma pode ser definida por duas características marcantes: a força e a doçura. Ele nasceu no Parque São Bartolomeu, já foi datilógrafo, porteiro e pedagogo. Mas, o professor sonhava mesmo em ser diretor e crítico de cinema. Vilma destaca que seu companheiro tem "dom da palavra e do amor". Atualmente, aos 47 anos, Zé é doutor em saúde pública pela UFBA e dá aulas na capital baiana e no interior do estado. Ao contar sua história, se emociona nos detalhes importantes. "Naquela época, eu descobri que Salvador tinha coisas bonitas, aí eu saía para ver todas as igrejas e museus da cidades, para ver vitrais, ver esculturas", contou ele ao iBahia. "Terra cara para gente barata" Zé e Vilma, assim como outros moradores do Subúrbio, tem o hábito de falar de Salvador como uma cidade diferente, distante da sua, muito motivados pela distância e pela realidade diferente que a região vive em relação ao centro. Esta distância também é social e é vivida com muito preconceito e discriminação. Ouvir a história de Vilma e de Zé, é conhecer um pouco da história do próprio Subúrbio de Salvador. História esta, que ambos conhecem bem. Zé afirma que a região não foi pensada para a população que lá vive. "O subúrbio não foi pensado para nós, era pra ser uma 'linha verde' na década de 70. Nós que ocupamos o Subúrbio", relembrou o professor que não apenas dá aulas, mas 'cria aulas'. O casal, que está junto há mais de 10 anos, conta com muito carinho sobre a vida em comunidade, sempre aos cuidados dos mais velhos, respeitando a natureza do local e a sua ancestralidade. Entretanto, eles relatam também que já viveram momentos de vergonha e constrangimento por virem do Subúrbio, chegando até a omitir a informação para terceiros. Destas situações, que nasceu a necessidade de materializar as belezas que o bairro possui em um acervo. Daí nasceu o primeiro "filho" do casal, o Acervo da Laje, que também é o primeiro museu do Subúrbio de Salvador.
Acervo de Histórias Em 2010, Zé e Vilma se reencontram, passaram a morar juntos e começaram sua coleção de artistas 'conterrâneos' de bairro. Isso despertou a curiosidade dos vizinhos, que iam visitar o casal e as obras colecionadas. "Naquela época em 2010, você precisava mostrar materialidade. E é isso que eu acho que diferencia o Acervo de outras propostas, é porque vai chegar e vai poder tocar nas obras. Você vai ver que as obras foram feitas por artistas de Periperi, do Lobato, do Rio Sena. (...) Cada espaço aqui tem vida", afirmou Zé Eduardo. O Acervo da Laje é mais que um museu para o casal de educadores. Antes de tudo, ele é a realização do sonho da casa própria, que se concretizou com muito esforço e privações. Neste imóvel, o casal não apenas reúne arte e cultura, como também fomentam a educação de crianças, que além de aprenderem a ler e a escrever, aprendem desde cedo a importância da arte, da cultura e dos costumes e conhecimentos passados pelos mais velhos que vieram antes. Zé destaca ainda sobre a importância do espaço em incentivar a sensibilidade e o repertório das pessoas para o belo. "A gente não pode deixar morrer a nascente da beleza que está em cada um de nós. Está no centro e na periferia, na casa das pessoas, tá em todos esses lugares. Salvador precisa se amar mais", afirmou o educador. Para Vilma, que sempre sonhou em ser educadora infantil, o espaço é um sonho de infância realizado. Para Zé, o Acervo é uma devolutiva para sociedade, pois durante a vida, ele sempre estudou em instituições públicas de ensino. Ele ainda acredita que espaços como este, de memória e de cultura, deveriam existir mais em diferentes bairros periféricos. "É um espaço de provocação para a cidade. Pra gente não ter jovens de vinte e poucos anos sem ter pisado em um museu antes. (...) Geralmente museus foram feitos para os brancos, a gente tem que tencionar isso. Os grandes museus pensam curadoria pra quem? Pra gente que é da periferia? Não, as curadorias são pensadas para as elites, justamente para afastar, pra que a gente não tenha acesso aquele capital simbólico que esta ali e é muito importante. Então o Acervo tenciona, provoca mas dialoga. A gente briga mas a gente dialoga", finalizou. Leia mais sobre Preta Bahia no iBahia.com e siga o portal no Google Notícias.
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AUTOR
Allana Gama
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