Depois de oito horas de trabalho, toda vez que o cobrador de ônibus Edízio Pereira, 53 anos, precisa ir ao banheiro, ele já começa a bolar estratégias. “Já passei muito aperto. Na hora, a gente tem que sair correndo, procurando algum bar ou casa pra socorrer”, conta Edízio. No fim de linha da Boca do Rio, onde ele descansa entre as viagens, a falta de banheiro levou os rodoviários a fazerem até vaquinha para usar o banheiro de um mercadinho. Cada um paga, em média, R$ 5. “Depois que o mercadinho fecha, a gente fica sem nada. Tem que segurar até encontrar um lugar escondido”, diz o motorista Eberson Machado, 40 anos.
O aperto não é exclusivo da Boca do Rio e ficou claro para toda a cidade anteontem, quando rodoviários fecharam a Estação da Lapa e pararam em mais seis bairros para se manifestar contra a demolição de um sanitário na Sabino Silva, em Ondina. Funcionários da Superintendência de Controle e Ordenamento do Uso do Solo (Sucom) fizeram a derrubada depois de uma requisição do Ministério Público estadual, assinada pela promotora Hortência Pinho. No ofício enviado à Sucom, ela pede a demolição de um módulo desativado da PM e do sanitário, que não fazia parte do módulo. Ontem, representantes do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários (Sttroba) se reuniram com o secretário municipal de Urbanismo e Transporte, José Carlos Aleluia, e os titulares da Sucom, Silvio Pinheiro, e da Transalvador, Fabrizzio Muller. Ficou definido que um sanitário será construído na Sabino Silva a partir de sexta-feira. E o resto da cidade? ImprovisoQuem fica no fim de linha da Santa Mônica, como o despachante Jackson Santana, 43, tem que improvisar. Ali, o banheiro tem “paredes de madeira” e um vaso colocado pelos próprios rodoviários. “Se não fosse isso, a gente não teria o que fazer”, lamenta Jackson. A busca do alívio é um desafio também no Queimadinho e na Cidade Nova. Nessa última, o motorista Djean Assunção, 51, também tem que ser criativo. “O jeito é encostar no ônibus e fazer xixi dentro de uma garrafinha”. Em Brotas, até tem um banheiro, mas o motorista José Carlos, 51, diz que não dá nem para entrar. “Chega a dar bicho”, afirmou. No final de linha da Pituba, há três banheiros químicos, evitados por muita gente. “Eu tenho nojo. Para a mulher, é pior ainda, porque o homem chega e em qualquer lugar faz”, disse a cobradora Andréia França, 38. E faz mesmo. Ontem, o repórter fotográfico Almiro Lopes flagrou um rodoviário urinando no muro do Porto de Salvador, em frente ao Terminal da França, onde também há sanitários químicos.
ImpassePor falar em sanitários químicos, dois foram instalados ontem na parada da Sabino Silva, mas já viraram alvo de queixas. “O problema é que agora nem podemos lavar as mãos, porque não tem torneira”, disse o motorista Jorgeval de Souza, 53. “Nosso banheiro era limpo, nós é que cuidávamos”, completou. A instalação dos sanitários foi determinada pelo prefeito ACM Neto, que disse ontem que a situação dos banheiros para os rodoviários “está no nosso radar de preocupação”. Segundo a promotora Hortência Pinho, a responsabilidade de construir e manter os sanitários é do município. “Esse é um equipamento do poder público. Não pode ficar com as empresas, porque elas mudam”, explicou ela, que solicitou providências à Secretaria Municipal de Urbanismo e Transporte (Semut). “Pedi que encaminhassem um relatório com as ações emergenciais e as soluções definitivas”, disse. Apesar de afirmar que os rodoviários não podem ficar sem os banheiros, ela defendeu a ação da Sucom. No próximo dia 29, uma audiência pública no MP vai tratar da mobilidade urbana. Segundo a promotora, os banheiros estarão na pauta. Colaborou Larissa Abrahão. Sanitários de outros pontos serão discutidos em reunião no dia 20Em uma reunião de quase quatro horas ontem, os rodoviários chegaram a um acordo com a Secretaria Municipal de Urbanismo e Transportes (Semut). A previsão é que sexta-feira a prefeitura inicie a construção de um novo banheiro na Rua Professor Sabino Silva, em substituição ao que foi demolido anteontem.
Não há previsão para o banheiro ficar pronto. Até que isso aconteça, os rodoviários devem utilizar os sanitários químicos. “Não podemos admitir que um trabalhador não tenha um lugar para fazer suas necessidades, ainda mais para uma categoria tão nobre como os trabalhadores de transporte coletivos”, afirmou o secretário José Carlos Aleluia. O presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários (Sttroba), Manoel Machado, diz ter boas expectativas. “A gente tem que confiar e esperar que eles façam a parte deles. Entendemos o sofrimento da população com nosso protesto, mas é uma necessidade”, argumentou. A questão da falta ou precariedade dos banheiros de outros finais de linha de Salvador será discutida em outra reunião, no dia 20. O secretário Aleluia diz que pretende discutir os problemas de todos os terminais. “Isso é para que eles possam usar os sanitários com algum conforto. Vamos avançar de forma progressiva, mas consistente. Vamos estar ouvindo sempre os rodoviários, mas também pretendemos conversar com os empresários”, afirmou. Para Machado, um modelo ideal de espaço nas paradas é o do final de linha de Vilas do Atlântico. “Demos essa sugestão. Tem banheiros feminino e masculino, área de descanso e até televisão”. Também estiveram presentes na reunião os superintendentes da Sucom, Silvio Pinheiro, e da Transalvador, Fabrizzio Muller, além do diretor de transportes, Eládio Gomes, e do subsecretário Orlando Soares. Sindicato nega relação de manifestação com saláriosO presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Transportes Rodoviários, Manoel Machado, afirmou ontem que as manifestações da categoria essa semana foram causadas por um incidente isolado - o do banheiro. Assim, garante ele, os protestos não têm o objetivo de mostrar a força dos rodoviários, já visando as negociações salariais com as empresas, representadas pelo Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros (Setps). “Foi uma questão localizada. Estávamos tranquilos e fomos surpreendidos por esse incidente, mas não estamos usando isso de maneira alguma para pressionar o patronato”, declarou. A data-base da categoria, quando devem se reunir com as empresas, é 1º de maio. “As negociações ainda não começaram, estão previstas para abril e estamos sempre apostando no diálogo”, disse Machado. O presidente do Setps, Horácio Brasil, não foi localizado ontem. Matéria original do CorreioApós protesto, Sabino Silva vai ter banheiro. E o resto da cidade?
Final de Linha da Sabina Silva ganhou dois sanitários químicos ontem; em Santa Mônica, banheiro da parada de ônibus é precário |
Este é o banheiro que os rodoviários têm que utilizar em Brotas; perto do Terminal da França, rodoviário esquece banheiro e vai ao muro |
Em ofício, promotora solicita demolição de módulo, incluindo banheiro |
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