A comissão que representa os moradores do subúrbio de Salvador comemorou nesta quarta-feira (16) a rescisão do contrato de implantação do VLT na região, anunciada pelo Governo da Bahia no final da tarde. Com a suspensão do acordo, o grupo espera que o sistema volte para a versão original, em trilhos, diferentemente do monotrilho proposto até então.
As informações foram passadas ao iBahia pelo líder comunitário Joceval Tiburcio, que acompanhava os trâmites que levaram à interrupção do negócio. Segundo o representante, uma audiência organizada pela Câmara de Vereadores deve discutir os próximos passos na tarde de quinta-feira (17), no subúrbio.
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A comissão por trás das negociações é formada por 4 instituições: Germa, Associação de Usuários dos Portos da Bahia (Usuport), União dos Bairros de Salvador (Unibairros) e Ver de Trem.
"Nós estamos comemorando o cancelamento do contrato e a gente tem indicativo de que o Governo vai anunciar o que a gente tem proposto, que é a restituição da ferrovia e a discussão de implantar o VLT sobre trilhos da forma que foi apresentada inicialmente. A responsabilização vai caber à Justiça", disse.
A construção do sistema foi apresentada em 2017 e licitada no ano seguinte, com assinatura de contrato em 2019. O transporte substituiria os trens, que foram desativados em 2021, mas as obras seguem paradas e sem previsão de entrega.
Quando o contrato foi assinado com o consórcio chinês Skyrail, o valor estimado do investimento para a construção do sistema seria de R$ 1,5 bilhão. No mesmo ano, a obra teve ordem de serviço autorizada e o governo chegou a divulgar que o projeto estaria 100% concluído no segundo semestre de 2024.
Quatro anos depois, a obra sofreu diversas alterações de prazos de entrega, de traçado e de valores, incluindo a mudança no formato dos trens. Dos iniciais R$ 1,5 bi para a conclusão do VLT, o valor atual já passa de R$ 5,2 bilhões, um aumento de 246%. A alteração no mapa de traçado do VLT do Subúrbio é apontada como uma das causas dos reajustes.
Ao longo desse período, moradores sofreram com a retirada dos trens, como relatou Joceval Tiburcio. Além do problema com transporte, a suspensão das atividades mexeu com a economia e o trabalho da população local. Quem usava o serviço pagava R$ 0,50 por passagem e agora desembolsa R$ 4,90 no ônibus.
"As pessoas usavam os trens, passavam moradores, os pescadores, as marisqueiras. O pescador passou a não vender mais. O cara que vendia no mercado informal passou fome. Muitas pessoas foram para o mundo das drogas. A maioria das marisqueiras está trabalhando com reciclagem para poder viver. Elas deixaram de exercer porque não tinha mobilidade".
Antes da parada, a operação, que acontecia há 160 anos, transportava cerca de 6 mil pessoas por dia. Os trens ligavam o subúrbio pela orla da Baía de Todos-os-Santos, em 10 estações, que seguiam de Paripe até a Calçada.
A alternativa oferecida para os moradores da região diante da falta dos trens, que ofereciam percurso coincidente, integral ou parcialmente, ao trajeto realizado pelo sistema foram 16 linhas de ônibus do transporte público da cidade. São elas:
- 1614 - Itaigara X Mirantes de Periperi Via Brotas;
- 1607 - Barra X Paripe Cocisa;
- 1550 - Vista Alegre/Alto de Coutos/Estação Pirajá;
- 1633 - Ondina X Mirantes de Periperi;
- 1606-01 – Base Naval Barroquinha;
- 1606-00 – Paripe X Barroquinha;
- 1651 - Lapa X Base Naval Via Estrada Velha;
- 1637 - Mirantes de Periperi - Imbuí/Boca do Rio;
- 0706-00 - Nordeste - Joanes / Lobato;
- 1642 - Lapa X Boa v. Lobato;
- 1615 - Lapa X Plataforma;
- 1568 - Barra X Faz. Coutos/vista Alegre;
- L111 - Baixa Do Fiscal / Lobato – Brasilgás.
- 1567 - Vista Alegre - Barra
- 1608 – Paripe X Ribeira
- 1635 – Joanes X Lobato X Rodoviária
Para Joceval, faltou conciliação com o que foi debatido com os moradores. Ele destaca que a mudança afetou a vida do subúrbio, e mexeu com a dignidade da população.
"Quando o tempo passou e a obra não saiu do papel, a população chegou a conclusão de que tudo o que a gente falava era real. Não deveríamos ter ficado sem o trem", ressaltou Joceval.
Rescisão
De acordo com o Governo da Bahia, a decisão de rescindir o contrato foi tomada após a Procuradoria Geral do Estado da Bahia (PGE-BA) apontar a medida como saída para a continuidade da implantação do sistema de transporte.
O Estado também pontua para a decisão a inviabilidade atual de reconhecer reequilíbrio econômico-financeiro sem estudos complexos e nem garantia de que o contrato manteria a capacidade de execução. Ou seja, não comprovada a vantagem da proposta da empresa.
Em nota, o Estado informou que a empresa chinesa foi notificada judicialmente e respondeu "concordando com o distrato".
O Governo informou também que a expectativa é de que a rescisão seja bilateral, de forma amigável. Em paralelo, o Estado estuda as alternativas para dar continuidade ao projeto, que é citado pelo Governo como prioridade e de fundamental importância.
"Ao notificar a concessionária Skyrail, o governo estadual reconheceu os esforços empregados para a devida manutenção do contrato em inúmeras tratativas desenvolvidas entre as partes nos últimos meses".
Alerta de procurador
Durante uma sessão realizada no dia 25 de julho deste ano no Tribunal de Contas do Estado da Bahia (TCE-BA), o procurador Ubenilson Santos, da Procuradoria Geral do Estado (PGE), já havia informado da grande possibilidade do Governo rescindir o contrato do VLT do subúrbio de Salvador.
"As medidas que poderão ser tomadas passam pela imediata execução ou rescisão, com grande possibilidade de ocorrer a rescisão ou distrato bilateral em curto espaço de tempo", afirmou na época.
Quando citou a possibilidade de destrato, o procurador geral do estado também havia informado que o processo administrativo que trata o caso já estava em fase de finalização de parecer jurídico na PGE.
"O distrato resolveria a questão para o estado, e poderia dar fim, inclusive, as controvérsias judiciais e aos processos que tramitam no TCE acerca do VLT", explicou durante a sessão em julho.
O que diz a empresa
"A BYD informa que vai cumprir a recomendação da SEDUR para rescindir de forma amigável o contrato para a construção do VLT do Subúrbio de Salvador. Após a assinatura do Primeiro Aditivo, em 2020, as obras de implantação do Contrato de Concessão foram prejudicadas pela Pandemia de Covid-19. Por conta disso, o avanço na execução do projeto do VLT do Subúrbio foi diretamente impactado por fatos imprevisíveis e de consequências incalculáveis, alheios às ações e responsabilidades da Concessionária.
Apesar de todo esforço feito pela Concessionária, seus acionistas, colaboradores e o Governo da Bahia e, considerando que sem o reequilíbrio pleiteado o Contrato de Concessão se torna inexequível, a Skyrail dará andamento nas negociações para rescisão amigável, visando apurar os valores indenizatórios devidos à Concessionária com compensação de valores a crédito do Poder Concedente.
A BYD Brasil, ao qual pertence o projeto de Skyrail Bahia, informa que pretende alocar todos os colaboradores em outras unidades de negócios do grupo e reforça seu comprometimento com a Bahia, polo importante e promissor para a implantação de complexos industriais.
Há um mês, a BYD anunciou um investimento de R$ 3 bilhões em três fábricas a serem instaladas em Camaçari – sendo uma unidade dedicada à produção de caminhões elétricos e chassis para ônibus, com possibilidade de abastecer o mercado das regiões Norte e Nordeste do Brasil, a outra dedicada à produção de automóveis híbridos e elétricos, com capacidade estimada em 150 mil unidades ao ano, e a terceira, ao processamento de células de lítio e ferro fosfato, com a expectativa de geração de 5 mil empregos".
Alan Oliveira
Alan Oliveira
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