Yuri, Renê e Eduardo. Todos vizinhos, moradores do bairro da Liberdade. Em pouco mais de um minuto, separados por cerca de 300 metros de distância, os três estavam mortos, caídos na rua. De acordo com a polícia, tanto Yuri Borges de Menezes Serra de Jesus, 16 anos, quanto Renê Leandro Batista dos Santos, 29, e Eduardo Santos de Jesus, 30, foram mortos pelo mesmo grupo, na noite de domingo. Moradores contam que, por volta das 19h30, um carro preto com quatro homens encapuzados passou pela Rua Euzébio de Queiroz e pelo Largo do Queimado.
Vestindo bermudas e, supostamente, carregando distintivos da polícia, eles desceram do carro ao se deparar com as vítimas. Depois, atiraram para matar e desapareceram, em fuga, deixando os três corpos para trás. Primeiro, foi Yuri. Depois que viu seu Vitória vencer o Bahia de virada, naquela tarde, o estudante decidiu sair de casa com a camisa rubro-negra (como na foto abaixo), para comer um pastel e visitar a namorada, moradora da Eusébio de Queiroz. Mas não teve tempo.
“Ele ia na barraquinha do pastel e ficou conversando com a namorada, quando veio o carro. De casa, ouvi os tiros. Foram uns 10, 12. Mas eu nunca imaginava que fosse ele”, conta o estudante Luís Henrique Silva, 13, vizinho e amigo de Yuri. De acordo com a Polícia Civil, um dos homens que estava no carro teria dito a Yuri: “É você”. Enquanto a garota com quem o adolescente estava fugiu, ele foi atingido por sete tiros e morreu no local, antes que pudesse ser socorrido. Yuri ainda teria implorado para não ser morto.
Amigos e parentes de três jovens mortos na noite de ontem na Liberdade fazem manifestação para pedir justiça (Foto: Marina Silva) |
O estudante e mais dois foram executados neste domingo no bairro da Liberdade |
“Ele não tinha nada a ver com o tráfico. Ainda pediu para não morrer, mas mandaram que ele se ajoelhasse”, relata o professor Edvaldo Brasil, que trabalha na Escola Estadual Luiz Navarro de Brito, onde Yuri cursava o primeiro ano do ensino médio. Sem envolvimento Nos últimos dois anos, Yuri foi o responsável pelo timbau na fanfarra do colégio e, desde abril, era estagiário do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (Ipac). “Meu filho saiu de casa todo perfumado para a morte. Ele era um menino tão bom, tão amado”, lamenta a mãe do jovem, Suzane Borges, amparada por parentes.
Sem perder tempo, os homens voltaram ao carro – e seguiram até o fim da rua. Já perto do Largo do Queimado, passariam direto, se não tivessem avistado Renê e Eduardo. O primeiro estava na porta de casa, encostado no Volkswagen Fox preto de seu primo. Já o segundo, caminhava na rua em direção à esquina. “Quando eles viram Renê e Eduardo, deram uma ré e saíram para atirar. Um foi atrás de Eduardo, outro foi em Renê. Eduardo ainda saiu correndo e caiu na porta da minha casa. Foram uns 30 tiros. Só Eduardo tomou uns dez”, registra o aposentado Jackson Luís, 33. “Eu tinha acabado de entrar em casa quando eles (os bandidos) passaram. Já chegaram dizendo que era ‘polícia’. Na hora que Renê levantou as mãos, para mostrar que não tinha nada de errado, atiraram na mão dele”, relatou o primo da vítima, Bruno dos Santos. A polícia não informou o número de tiros que o atingiram. Renê e Eduardo ainda chegaram a ser encaminhados ao Hospital Geral Ernesto Simões, mas morreram na unidade. Renê, que era divorciado, morava com a mãe, Lícia Oliveira. Quando ela ouviu os primeiros disparos correu para a janela do andar de cima da casa - ainda a tempo de ver a execução de seu filho. “Ele ficou parado, porque achou que não ia ser com ele. Só vi aquelas armas prateadas grandes. Pense em como é perder meu filhinho. Eu cuidava tanto dele”, desabafa Lícia, sob efeito de calmantes.
Segundo a família, Renê era motorista do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJ-BA), embora a assessoria do órgão tenha negado. Nas horas vagas, ele trabalhava fazendo bicos como mecânico. Além disso, Renê estaria estudando para tornar-se pastor: trabalhava como obreiro na Igreja Assembleia de Deus. Segundo vizinhos, Eduardo também era evangélico. “Conhecia ele de vista, mas todo mundo sabia que ele era trabalhador. Era uma pessoa de bem. Se não me engano, era mototáxi”, afirma o aposentado Jackson Luís, 33. Protestos Na manhã da segunda-feira (22), cerca de 150 moradores e estudantes da escola onde Yuri estudava fizeram um protesto no bairro. Inicialmente, o grupo fechou a Rua do Queimado com pneus e pedras e depois seguiu em passeata. “Autoridade não resolve e pessoas que não têm ligação com nada pagando o preço”, reclamou o técnico em gás Deivdson dos Santos, 33, durante o ato.
“O que está acontecendo é que o tal do Aranha para, mata e acabou. Esse Aranha e o grupo dele estão botando o terror, matando gente inocente”, disse um manifestante, sob anonimato, referindo-se a Gilmar Silva Tanajura, 29, apontado pela polícia como líder do tráfico na Avenida Peixe, na Liberdade. No final da tarde, moradores voltaram a protestar contra a falta de segurança no bairro - um grupo chegou a fechar o Largo da Soledade. PMs acompanharam o ato. Em nota, a Secretaria Estadual da Educação (SEC) lamentou a morte de Yuri. As aulas no colégio do adolescente foram suspensas, ontem, mas devem retornar hoje. Os corpos de Yuri e Eduardo foram enterrados na tarde de ontem, no cemitério Quinta dos Lázaros. Já Renê foi sepultado no cemitério da Ordem Terceira de São Francisco. Matéria original do Correio "Ele pediu para não morrer", diz professor de adolescente morto na Liberdade
Avó de Yuri Borges, Maria José Serra |
Bruno dos Santos, primo de Renê Leandro Batista |
Sob o olhar de PMs, amigos e parentes de mortos realizam protesto na Liberdade para pedir justiça. Outro protesto, na tarde de ontem, terminou com pneus queimados na Soledade |
Veja também:
Leia também:
AUTOR
AUTOR
Participe do canal
no Whatsapp e receba notícias em primeira mão!
Acesse a comunidade