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Geovane (Foto: Arquivo CORREIO) |
Geovane Mascarenhas de Santana, 22 anos, foi morto dentro das dependências da sede da Rondesp (Rondas Especiais), unidade da Polícia Militar, no bairro do Lobato. É o que consta na denúncia oferecida do Ministério Público Estadual (MPE) à 1ª Vara do Tribunal Júri, a que o CORREIO teve acesso. Segundo a denúncia, Geovane foi morto por decapitação, de joelhos, depois de ser colocado no fundo de uma viatura da Rondesp e conduzido ao local sem que “estivesse na prática de qualquer delito que justificasse sua prisão”. Ao todo, 11 policiais foram denunciados pela promotora de Justiça Isabel Adelaide Moura no último dia 11, com base em inquérito policial, instaurado pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). O crime, cometido no dia 2 de agosto, foi apurado depois de o CORREIO denunciar o desaparecimento do rapaz, no dia 13 daquele mês. O jornal revelou, com exclusividade, imagens da abordagem policial em que Geovane é colocado dentro de uma viatura da Rondesp. A denúncia aponta como responsáveis pela morte 11 policiais da Rondesp Baía de Todos-os-Santos: o subtenente Cláudio Bonfim Borges; os sargentos Gilson Santos Dias e Daniel Pereira de Souza Santos; e os soldados Jesimiel da Silva Rezende, Jailson Gomes Oliveira, Cláudio César Souza Nobre, Fábio Nobre Lima Masavit Cardozo, Jocenilton Santos Ferreira, Roberto Santos de Oliveira, Alan Moraes Galiza dos Santos e Alex Santos Caetano. Os 11 foram denunciados por sequestro, roubo (a moto e o celular de Geovane não foram localizados) e homicídio qualificado (por motivo torpe e sem possibilidade de defesa da vítima). Seis deles (Cláudio, Jesimiel, Roberto, Alan, Daniel e Alex) foram denunciados também por ocultação de cadáver. Apesar disso, a promotora Isabel Adelaide não pediu a prisão de nenhum dos policiais, e excluiu da denúncia, os crimes de tortura e formação de quadrilha, que constavam no inquérito policial que investigou o caso. “No momento não existe motivos para pedir a prisão deles. Primeiro, porque o fato se deu em agosto, então não posso dizer que existe um clamor popular. São pessoas que têm profissão definida e endereço certo e, até então, não existe nenhum motivo que justifique ultrapassar o direito que eles têm de responder ao processo em liberdade”, declarou a promotora, ontem, durante coletiva no Ministério Público Estadual, no CAB. Presente também na coletiva, o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Anselmo Brandão, disse que todos os policiais foram afastados do serviço ostensivo para atuar em atividades administrativas, além de responderem a processo disciplinar. A ação agora será julgada pelo 1º Juízo da 1ª Vara do Tribunal do Júri.
O crime Segundo a denúncia, no dia 2 de agosto de 2014, às 16h58, Geovane pilotava sua moto CG 125 (JRB 9929), quando foi parado por uma guarnição da Rondesp BTS, na Rua Nilo Peçanha, na Calçada e abordado “de forma excessivamente agressiva” — as imagens mostram que Geovane é agredido pelos policiais.
A guarnição era integrada pelo subtenente Claudio Bonfim Borges, e os soldados Jesimiel e Jailson (os três já ficaram dois meses em prisão temporária pelo crime, entre 15 de agosto e 12 de outubro). Geovane foi levado pela viatura de número 2.2211, juntamente com a moto, para a Rua Luiz Maria, nas imediações do Atacadão Recôncavo, quando foi apresentado a uma mulher que alegou ter sido vítima de roubo. Ela, porém, não reconheceu Geovane. Às 17h21, chegou ao local a segunda viatura, de número 2.2203, com o sargento Gilson e os soldados Claudio, Fabio e Jocenilton. As viaturas permaneceram juntas até às 17h25 e depois seguiram para a sede da Rondesp, no Lobato. Geovane foi, então, executado dentro das dependências da Rondesp. Às 21h, Cláudio e Jesimiel, que no dia se encontravam de serviço extra na Operação Visão Noturna deixam a sede da unidade, junto com o sargento Daniel e os soldados Roberto, Alan e Alex. O grupo sai dividido em duas viaturas, 2.2204 e R-10, até a Travessa São Rafael, Rua das Casinhas, próximo ao Parque São Bartolomeu, onde abandonaram o corpo mutilado, para em seguida atearem fogo, “na tentativa de ocultar o cadáver”. A denúncia acrescenta que “o corpo da vítima foi localizado no dia seguinte, numa casa abandonada, e a motocicleta deste, juntamente com o aparelho celular que carregava, foram subtraídos pelos acusados”. Decapitação Como o CORREIO revelou em 19 de setembro do ano passado, os laudos apontaram que Geovane foi morto por decapitação.No entendimento do MP, os acusados impossibilitaram qualquer ação defensiva da vítima , “sendo ela surpreendida, sem nenhuma justificativa legal, presa, e mantida sob a guarda dos denunciados quando então foi subjugada, e morta, com a ressalva de que, de acordo com a perícia, foi ela decapitada”. Ainda segundo o MPE, Geovane teve decepadas as mãos e a genitália, e, como também já havia sido revelado, os denunciados extraíram do corpo partes das tatuagens com o objetivo de dificultar a identificação.
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A abordagem da PM a Geovane (Foto: Reprodução) |
GPS A investigação mostrou que os policiais desligaram o GPS da viatura 2.2211 e cortaram a fiação da câmera instalada no carro, o que demonstrou que os acusados “já com o objetivo de agir ilicitamente, tentaram inviabilizar eventual controle de suas ações”. Por fim, eles ainda elaboraram um relatório de serviço descrevendo que naquele dia haviam feito rotas e rondas em locais “absolutamente diversos” do real. O que os policiais provavelmente não sabiam — e que permitiu à polícia apurar as reais localizações — é que o GPS, mesmo desligado, emitiu sinais a uma central em outro estado e que o radiocomunicador portátil (HT) usado por Jesimiel também registrava a localização. Além disso, as localizações das viaturas 2.2204 e R-10 foram emitidas pelos seus rádios fixos. [youtube UEAry339RQ0#t=88]
Conhecidos A denúncia não deixa clara a motivação do crime. Fala apenas em motivação “torpe, considerando que agiram os acusados em comunhão de ação e desígnios, em uso de autoridade conferida pelo Estado, para sequestrar e matar quem por eles eleito deveria morrer”. O documento revela ainda que o soldado Jesimiel conhecia Geovane e que o identificou na abordagem inicial, na Rua Nilo Peçanha — já que ele estava sem capacete — e que a ex-companheira de Geovane é prima “carnal” da esposa de Jesimiel havendo relatos de que havia uma antipatia do policial com a ex de Geovane.
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Comandante da PM e secretário Maurício Barbosa durante coletiva sobre caso Geovane (Foto: Almiro Lopes) |
Cronologia do Crime 1 - às 16h58 do dia 2 de agosto de 2014, Geovane, que pilotava a moto CG 125 Fan, de placa JRB 9929, na Rua Nilo Peçanha, na Calçada, é abordado por guarnição da Rondesp/BTS integrada pelo subtenente Claudio e os soldados Jesimiel e Jailson (veja abaixo os denunciados). 2 - EM SEGUIDA, “sem que estivesse na prática de qualquer delito que justificasse sua prisão”, segundo a própria denúncia, Geovane é conduzido na viatura Nº 2.2211 para a rua Luiz Maria, e apresentado a uma mulher vítima de roubo. Ela não o reconhece. 3 - ÀS 17h21, chega à rua Luiz Maria a viatura Nº 2.2203, com o sargento Gilson Santos e os soldados Claudio César, Fábio Sodré e Jocenilton Ferreira. As viaturas ficam juntas ali até 17h25, quando ambas seguem para a sede da Rondesp, no Lobato. 4 - Na sede da Rondesp, os policiais militares matam Geovane, “inclusive retirando-lhe as mãos, a genitália e a cabeça” e “ainda extraíram do seu corpo as partes tatuadas”, segundo a denúncia, que acrescenta que a vítima foi “subjugada” e decapitada, como o CORREIO já havia revelado. 5 - ÀS 21h, o subtenente Claudio e o soldado Jesimiel saem da sede da Rondesp, junto com o sargento Daniel Pereira e os soldados Roberto Santos, Alan Moraes e Alex Santos. O grupo se divide nas viaturas 2.2204 e R-10 e segue para o Parque São Barolomeu, onde abandonam e ateiam fogo no corpo mutilado.
OS DENUNCIADOS Subtenente Claudio Bonfim Borges Sargentos: Gilson Santos Dias e Daniel Pereira de Souza Santos Soldados: Jesimiel da Silva Resende Jailson Gomes Oliveira Claudio Cezar Souza Nobre Fábio Sodré Lima Masavit Cardozo Jocenilton dos Santos Ferreira Roberto Santos Oliveira Alan Moraes Galiza dos Santos Alex Santos Caetano