A conta não fecha: entre o volume de água produzido pela Empresa Baiana de Águas e Saneamento (Embasa) e a quantidade que passa pelas torneiras das casas baianas que têm autorização para utilizar o serviço da companhia existem, em um ano, 249,4 milhões de m³ de água que se perdem. Com esse volume, seria possível abastecer Salvador e Região Metropolitana por cerca de 15 meses, seguindo o padrão de consumo de 2014, quando foram faturados 196,8 milhões de m³. O valor é uma média do percentual perdido pela empresa entre os anos de 2009 e 2013. Nessa conta estão incluídas perdas com vazamentos e com os chamados ‘gatos’ (ligações clandestinas).
Você pode pensar: mas se alguém usou essa água irregularmente, mesmo que não tenha pago, ela não foi desperdiçada. Para o superintendente de abastecimento de água de Salvador e RMS da Embasa, José Moreira, não é bem assim. “A média de consumo das residências de Salvador é de 13,6 mil litros. A média dos locais com fraude é de 36 mil, a estimativa. Quem pensa que está tendo vantagem não tem um consumo consciente, gasta além do que precisa”, diz. RANKINGPara o Instituto Trata Brasil, uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip) de proteção dos recursos hídricos e saneamento, a redução nos índices de perdas é considerada pequena nas principais cidades brasileiras. A entidade criou um ranking com base nos últimos indicadores (2011 e 2012) divulgados pelo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), do Ministério das Cidades. Segundo a lista, que incluí as 100 maiores cidades brasileiras (com mais de 250 mil habitantes), Salvador se encontra na posição 34 (considerando índices de abastecimento e de saneamento, além dos de perda). A posição da capital baiana especificamente em relação às perdas na distribuição teve indicador de 48,70% de perda - o que deixa a cidade na segunda faixa de classificação entre as que mais perdem (o ideal, para o instituto, seria de 15%). Esse indicador mede o nível de perdas no município, em porcentagem da água produzida. Apesar da situação da capital, está na Bahia a cidade brasileira com menor perda na distribuição: -1,35% foi o índice de Vitória da Conquista. Relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para Água e Saneamento, Leo Heller, que esteve em Salvador esta semana para uma palestra organizada pelo Sindicato dos Trabalhadores em Água (Sindae), defende que não só o consumidor tem que ser punido com multas, mas que as companhias também precisam se readequar para reduzir as perdas. “O que se ganha crescendo o sistema e indo buscar uma barragem mais longe é algo que poderia ser feito com a redução das perdas”, aponta ele. Especialista no assunto, o professor das faculdades de Engenharia e Medicina da Universidade Federal da Bahia Luiz Roberto Moraes defende mudar a lógica de ampliação do sistema pela de melhoria da eficiência do que já temos. “Esses indicadores mostram que a redução das perdas não é uma prioridade. Se Salvador reduzisse esses indicadores, não precisaríamos, por muito tempo, buscar outro manancial, fazer outras barragens. Acontece que a lógica capitalista dos fabricantes de tubos, das empreiteiras, querem e pressionam por novas construções”, critica Moraes. Ele cita que países como o Japão e a Holanda têm perdas menores do que 10% do volume de água captada. A Austrália também é uma referência em baixo desperdício, com 16% de perda. Moraes reforça a necessidade das companhias serem aliadas do Ministério Público e da polícia para garantir a fiscalização e o cumprimento das leis. O pesquisador defende a ampliação da atuação do poder público. “Quando se fala em economia de água, a cobrança logo recai sobre o consumidor. Claro que isso é importante, mas é bom destacar que apenas 9% de toda a água doce é utilizada para o consumo humano. Ou seja, é preciso políticas públicas para se cobrar melhorias em outros setores como a agricultura e a indústria”, comenta. MOTIVOS As empresas classificam as perdas como “aparentes”, como as de consumo clandestino, e “reais” ou “físicas”, grupo em que se encontram os vazamentos das tubulações e adutoras. Segundo Moreira, a estimativa na Bahia é que os gatos correspondam a 70% desse prejuízo. Em 2014, foram estimados prejuízos de R$ 121,7 milhões. O representante da Embasa reconhece que há dificuldade na troca de tubulações antigas, que por causa do desgaste do tempo facilitam a perda de água. Essa complicação é basicamente por serem obras com intervenções longas e impactos principalmente no trânsito. “Temos tubulações antigas, novas e de meia-idade. A Avenida Sete e a Rua Chile, por exemplo, são antigas, têm cerca de 50 anos as tubulações. É difícil fazer uma obra naquela região, por isso aguardamos a oportunidade de outras obras para fazer a substituição, como na Barra. Aproveitamos a requalificação e hoje a tubulação lá é a mais moderna”, explica. Moreira, no entanto, atribui à topografia da cidade os principais problemas de vazamento de água, que se agravam com o crescimento desordenado e sem planejamento da cidade.
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